Argumentos do Sim

Perspectiva liberal

De um ponto de vista liberal, não se pode tolerar que o Estado imponha aos cidadãos um qualquer ponto de vista moral. Os cidadãos devem ser livres de agir de acordo com as suas consciências, enquanto a sua actuação não fizer diminuir a liberdade dos outros cidadãos. Não podemos admitir que o Estado imponha aos cidadãos o seu julgamento moral sobre o que se pode ou não pode fazer.

A sociedade portuguesa está dividida no seu julgamento moral acerca do aborto: enquanto que muitos portugueses consideram o aborto imoral, muitos outros não partilham dessa opinião -- ou, pelo menos, agem em contradição com ela. Não cabe ao Estado intervir, decretando que qualquer destes grupos de pessoas tem razão.

Alguns tentam fugir ao argumento anterior, argumentando que, quando uma mulher aborta, estará a ofender as liberdades, nomeadamente o direito à vida, de outrem - do embrião abortado. Mas muitos portugueses não compartilham desta posição, uma vez que não consideram que um embrião seja um ser humano, provido de todas as liberdades e de todos os direitos de um ser humano. Mais uma vez, não cabe ao Estado intervir, impondo à sociedade um julgamento sobre quem é um ser humano e tem os inerentes direitos.

Perspectiva pragmática

O aborto é uma realidade lamentável mas inescapável. Embora seja triste que muitas mulheres efectuem abortos, essa é uma realidade que não podemos evitar. Podemos naturalmente tentar evitar o maior número possível de abortos individuais, mas devemos também procurar que os abortos que, de qualquer forma, serão praticados, o sejam nas melhores condições possíveis e com o menor sofrimento possível. Só a despenalização do aborto, dentro de um prazo realista (praticável), permite garantir que todas as mulheres que estejam firmemente determinadas a abortar o farão em condições seguras e não traumatizantes.

É necessário um compromisso entre o direito à vida e o direito ao planeamento familiar. Não há planeamento familiar eficaz sem a possibilidade de, como solução de recurso, abortar. Efectivamente, todos os meios contraceptivos falham, por vezes, seja por razões técnicas seja por falha humana. O direito à vida sugeriria que a vida humana deveria ser protegida desde o instante da concepção. O direito ao planeamento familiar requeriria a possibilidade de abortar até ao fim da gravidez -- tal como de facto é permitido nalguns países -- ou até mesmo de efectuar infanticídios -- tal como é praticado noutros países. O aborto até às dez semanas de gravidez é um compromisso bastante restritivo, mas ainda assim realista, entre essas duas posições extremas. Ele permite garantir que o planeamento familiar efectivo é possível, mas sem uma violação intolerável do direito à vida.